terça-feira, dezembro 19, 2006

Noções básicas de fonética



Sem qualquer veleidade científica, eis algumas noções de fonética bragançana



1 - O Bragançano desconhece o som 'v'. Quem diz que ele troca os 'b' pelos 'v' não sabe o que diz! É "baca" como é boi!

2 - Os 'r' iniciais ou dobrados são sempre rolados.

3 - Mesmo quando dobrados, os 's' pronunciam-se sempre como o 's' final de membros. Exceptua-se o sapato que, na Idade Média, já se escreveu "çapato".

4 - O 'ch' não corresponde a 'tch'; é pronunciado de uma só vez, com a língua totalmente colada ao céu da boca.

5 - Os ditondos "eu" dos pronomes "eu", "meu" "teu", seu" e de algumas pessoas verbais (deu) pronunciam-se como 'ou', em que o 'o' é dito como os 'a' de "cada"

6 - Normalmente não se faz ditongo em palavras como "rio", "tio" "frio". Diz-se 'ri-o'; 'ti-o'; 'fri-o', embora se seguido de nome próprio, se diga, 'tiu'.

7 - Os 's' do verbo dizer (dezer), no pretérito perfeito do indicativo, pronunciam-se 'x': dixe, dixeste, dixe, dixemos, dixestes, dixeram (dixêmos; dixerum).

8 - Em 'uma' faz-se a nasalção do 'm', pronunciando-se ua (lamento, mas não consigo pôr o til sobre o 'u')

9 - Plurais das palavras com 'o': se a palavra é pronunciada, no singular, com 'o' aberto, ele mantem-se aberto no plural. O mesmo para o 'o' fechado. Assim: é ólho e são ólhos; mórto e mórtos, tórto e tórtos, etc. da mesma forma que é côrpo e são côrpos; tôrdo e tôrdos; bôlso e bôlsos, etc. Há uma palavra derivada de 'olho' que faz excepção, não no plural, mas na pronúncia: Birolho, que se pronuncia birôlho.

10 - O pronome pessoal lhe diz-se sempre le: ou dixe-lo; tu dixeste-lo, dize-lo tu, etc.

11 - O 'z' final pronuncia-se sempre 'ze': narize; perdize, fize, etc.

12 - O imperativo plural faz-se sempre de acordo com a desinência latina: amaide (amate); fazeide (facite); andaide (andate), etc.

13 - É frequente a comutação do 'a' mudo em 'e' aberto: Brègança; èrgueiro

6 Comments:

Blogger Jorge P. Guedes said...

Expressões como "arriar o calhau", "bater-se com", "doutor da mula ruça", "fazer pouco de...", com língua de palmo" e outras...eram por mim, também, usadas diariamente no Porto dos anos 50.
Recolha muito interessante e trabalhosa.
As explicações fonéticas são muito úteis e curiosas.
Um belo trabalho linguístico!

P.S.- Não te esqueças de dar de comer à Jacqueline, , que apesar de rosada é engraçadinha...

Parabéns e um abraço.

11:03 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Então agora, além de pai és padrinho da bichana? Jacqueline? Assim seja, que de comer se não há-de queixar!

Quanto às expressões idiomáticas, creio que algumas delas se utilizam em muitas regiões do país e no Porto, por maioria de razão!

Obrigada pelas tuas palavras.

Um abraço

11:08 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Quando aqui cheguei, esperançado, a minha alegria e prazer foi sincera, entusiasta que sou destas migalhas, que parecem tão-somente interessar a uns caturras, mas afinal ainda têm abrigo sapiente à sombra deste espaço: felizmente temos o “Brègancês”, para nosso deleite. Agora, nesta madrugada – são 5 horas, pouco durmo –, enquanto me fogem por algum cansaço, os justos e merecidos elogios que aqui devia exarar, acrescento apenas, que este é um brilhante trabalho de didáctica recolha da nossa fonética regional. E, sinceramente, afinal, não preciso de dizer mais nada: o resultado está aqui, para ser visto e apreciado.

5:18 da manhã  
Blogger MPS said...

Que bondade a sua, Porca da Vila!

Vou acrescentá-las assim que tiver um tempinho. De quantas me indicou, não conhecia, de todo, 'crueiro'; 'galgado'; secadal e 'tabafeia'. Quanto à 'samarra', se me permite, vou grafá-la "çamarra", mais conforme com o que escrevi nas noções de fonética. 'Imbelga' já lá estava, em 'embelga', embora com significado diferente.

Já agora, e tendo em conta a definição que dá de 'galgado', não poderá ser sinónimo de 'embelga'?

Um abraço e muito obrigada!

4:46 da tarde  
Blogger ContorNUS said...

Recolha muito interessante porque
as fonéticas fazem toda a diferença e poucas vezes são referidas nas obras literarias que consultei.

Uma boa recolha que nos foi dada a partilhar.

4:42 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Cara Maria de Fátima Stocker:

Passei de novo para ler e reler este seu atraente artigo, que tanto me interessa e apaixona.

Em relação às notas deixadas por um visitante interessado, e sobre «crueiro», acrescento que o mesmo termo era usado pelos velhos minhotos, com o sentido de terra magra, pouco produtiva, enquanto «crueira» significava uma doença que afectava os animais domésticos, embora em particular as galinhas. Recordo a minha santa avó dizer quando de manhã surpreendia uma ou duas galinhas mortas pela morrinha: «Foi uma crueira que lhe deu».

«Bueiro» ou «boeiro», no falar das antigas gentes do Minho, era um buraco feito num muro, ou por baixo dum caminho, para servir como cano de drenagem das águas pluviais, cano de esgoto.

Secadal, não me consta que fosse usada no Minho, portanto é um puro regionalismo transmontano, no mínimo.

Samarra era uma véstia rústica feita de pele de ovelha ou carneiro, ou um casaco rústico, como um sobretudo curto, com gola de peles. Mas no Minho deu origem a um provincianismo com o significado de costa, costado: «deram-lhe uma pancada na samarra». A minha mulher e a minha sogra dizem que em Vila Flor, «samarra» significa homem corcunda, ou a marreca do corcunda.

Tabafeia ou tabafeira é puro regionalismo transmontano, a significar alheira.

Desculpe estas coisas de quem muito aprecia a sua página. Até breve.

5:05 da tarde  

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